Em vez de enxergar jogos com os olhos de Vanderlei Luxemburgo — para quem não há nada novo no futebol —, siga o conselho do saudoso Telê Santana. O mestre dizia que partidas aparentemente inexpressivas sempre permitem boas descobertas. Portanto, não ignore amistosos e a Copa das Confederações, por exemplo. Uma moda retrô usada pelo Brasil na conquista do pentacampeonato mundial, em 2002, na vitória por 2 x 0 sobre a Alemanha, é uma tendência que está reconquistando grandes seleções a menos de um ano da Copa de 2018.
Em 30 de junho de 2002, Marcos; Lúcio, Edmílson e Roque Júnior; Cafu, Kleberson, Gilberto Silva, Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos; Rivaldo e Ronaldo brindavam o Brasil com o quinto título mundial. A Seleção era configurada por Luiz Felipe Scolari em um sistema tático com três zagueiros — o 3-5-2. O Correio teve acesso a dois rascunhos táticos feitos à mão por Felipão para Jairo dos Santos, seu observador técnico na Copa de 2002 (ler arte). O sistema, que fracassou com Sebastião Lazaroni na Copa de 1990, mas foi vitorioso na prancheta do patriarca da família Scolari, tinha variáveis para o 3-3-3-1 e o 3-4-2-1.
“A vantagem maior de jogar com três zagueiros naquela Seleção era a segurança da defesa, cobertura mais sólida com a minha adaptação ao Edmilson e ao Roque Júnior. Isso deu confiança para a equipe. A outra vantagem é que o Roberto Carlos e o Cafu tinham mais liberdade para subir ao ataque. A gente sabia da qualidade e da força deles. Deu certo. Nós tivemos a melhor defesa, sofremos apenas quatro gols e vencemos todos os sete jogos”, lembra o zagueiro Lúcio em entrevista ao Correio. O brasiliense era um dos titulares de Felipão.
Quinze anos depois, o 3-5-2, inspira seleções candidatas ao título na Rússia, em 2018. Com a bola, é 3-5-2. Sem ela, vira 5-4-1, como se fosse uma sanfona. Atual campeã do mundo e finalista da Copa das Confederações contra o Chile, a Alemanha, de Joachim Löw, está se reinventando. Nas quartas de final da Euro-2016, os germânicos enfrentaram a Itália no 3-5-2, com Höwedes, Boateng e Hummels formando a trinca de beques. Na Copa das Confederações, Joachim Löw usou o 3-5-2 contra a Austrália, o 3-4-2-1 diante do Chile e de Camarões, e o 3-4-3 contra o México. Kimmich, Ginter e Rüdiger são as três torres.
Protótipos
Tite está na Rússia acompanhando in loco as semifinais. Ele percebeu a mudança. “Me parece que a Alemanha joga com três zagueiros, três defensores centrais. Isso também serve de aprendizado para mim”, comentou em entrevista ao SporTV. O próprio Tite testou uma formação alternativa na goleada sobre a Austrália, com os zagueiros Thiago Silva, Rodrigo Caio e David Luiz.
Fiel ao tradicional 4-4-2, a Inglaterra é outra campeã mundial que tem ensaiado o sistema com três zagueiros. Na derrota por 3 x 2 para a França, no último dia 13, Stones, Cahill e Jones formaram a defesa no esquema 3-4-2-1 do técnico Gareth Southgate. A Itália, de Giampiero Ventura, alterna defesa com linhas de quatro e de três defensores. Neste ano, perdeu para a Holanda no 3-5-2 e goleou o Uruguai no 4-4-2.
Na Argentina, a era Jorge Sampaoli começou com três zagueiros nas vitórias sobre o Brasil (1 x 0) e Singapura (6 x 0). Nicolás Otamendi, Jonathan Maidana e Gabriel Mercado foram os escolhidos nos sistema tático 3-4-2-1. O formato lembra bastante o Brasil pentacampeão em 2002. Goméz, Biglia, Banega e Di María formavam o meio de campo e o ataque tinha Messi e Dybala, responsáveis por abastecer o centroavante Higuaín.
“A vantagem de jogar com três zagueiros era a segurança da defesa. Sofremos quatro gols e vencemos os sete jogos”
Lúcio, zagueiro pentacampeão
“A Alemanha joga com três zagueiros, três defensores centrais. Isso também serve de aprendizado para mim”
Tite, técnico da Seleção Brasileira
Recorde na Copa de 1998
Além dos Brasil, duas seleções foram campeãs mundiais usando três zagueiros: Argentina de Carlos Bilardo, em 1986, e a Alemanha de Franz Beckenbauer, em 1990. Por sinal, o argentino Bilardo reivindica a paternidade do sistema. Com a bola, é 3-5-2. Sem ela, vira 5-4-1.
Na comparação entre as últimas sete Copas do Mundo, a de 1998 foi a que mais teve seleções configuradas com três zagueiros: 20 das 32. Na sequência, os mundiais de 2002 (17) e de 1990 (14). Na edição de 1994, nove países recorreram à constestada tática.
O curioso é que, depois do penta do Brasil, o 3-5-2 caiu em desuso na Copa. Cinco seleções usaram em 2006, cinco em 2010 e apenas três em 2014. Em 2017, o campeão inglês Chelsea e a italiana Juventus são dois clubes responsáveis pela ressurreição do esquema.